Fareja-se e fareja-nos quando lhe interessamos. É mau na sua essência porque nunca leva ao bem, nem ao bom, nem ao belo: ele divide, discrimina, trata mal, é egoísta, velhaco e só tem olhos para si próprio e para as limitações e defeitos dos outros.
Tem um cheiro especial que atrai os incautos, que pensam que se chegarem a ele o vão usar bem. Simplesmente tal não acontece porque seria dar-lhe e acreditar nas possibilidades que ele não tem.
Apresenta-se sob variados disfarces: riqueza, saber, beleza, disponibilidade, simpatia, palmadinhas, mãos abertas, elogios e muitos outros mas, no final, dá sempre a machadada da prepotência e volta àquilo que é: mau!
Nunca encontrei ninguém que o exercesse ou para ele olhasse com simpatia que passasse incólume à sua atracção e exercício, mesmo os mais virtuosos: mandar, dominar, controlar, indicar, impor... mesmo quando debaixo de uma capa de respeito pelo outro e pela sua opinião... coisa que, verdadeiramente, nunca acontece.
Ele diz e é para ouvir; ele manda e é para obedecer; ele ordena e é para cumprir; ele assinala e é assim mesmo.
Exercê-lo leva sempre ao domínio. A ele cabe sempre a última, a penúltima e a antepenúltima palavra... mesmo que, pelo meio, deixe cair alguns grãos de milho para consolar o burro.
Não há vacina que o previna, remédio que o cure ou mezinha que o apazigue, embora já tenham sido feitas muitas tentativas e sofisticadas experiências. Quem por ele passa (quem o xerce) fenece na grandeza, mingua na humildade, sovina na generosidade, incha no orgulho (ele... e família), arrota na prepotência, baba-se na estupidez e vangloria-se na ignorância.
Não o queiras, não o desejes, não o almejes, mesmo quando se disfarce em serviço! Que é, afinal, a capa mais subtil que veste para se insinuar e tornar apetecível. Jj-a
Talvez, j-a. Mas não presumas deter a solução para uma das inquietações que acompanham o "socius" desde a aurora dos tempos. Poder, autoridade, obediência; põe-os ou suprime-os: em qualquer caso, pouco te agradará o que obténs.
ResponderEliminarAbraço.
Nicolau M.
Não concordo, Jj-a.
ResponderEliminarEntendo o teu ponto de vista, como tu entenderás no meu. Se estivéssemos à volta de uma mesa, certamente estaríamos de acordo.
Primeiro: O poder está na natureza humana. Se não existe, alguém o cria. Então é melhor participar nele, para o controlar.
Segundo: O poder desperta o que há de pior nos homens, mas também o melhor. Por isso, devemos manter-nos por perto, para premiar o bom e criticar o errado.
Terceiro: Em tempos de crise como estes, aparecem sempre estas ideias. Mas temos de sujar as mãos na massa, para evitar os salvadores da pátria que dizem detestar o poder, mas vão fazer o sacrifício de o exercer, em nosso nome. Já nos escaldámos e os sinais estão de volta: temos um Presidente que diz não ser político, mas há mais de 20 anos não faz outra coisa!
Um abraço.
José Teodoro
Caros, Nicolau e JT! Resolvi dizer duas coisas sobre as vossas interessantes observações ao meu textículo. Primeiro para tranquilizar e dizer ao Nicolau de que não tenho, nem presumo vir a ter a "solução" para uma das inquietações do "socius desde a aurora dos tempos" (o poder). Nem sei porque deveria ter. O meu textículo não tem nenhumas outras pretensões a não ser falar de algo que venho observando e até vivendo, porque pertenço a uma instituição onde existe poder e posso observar o seu exercício com algum pormenor, além de outras e outros, está claro. Faço-o numa abordagem meramente empírica, mas nem por isso menos atenta. Quanto ao resultado que se possa obter com a sua supresssão ou não, não é algo que me preocupe ou interesse. Acho que como ideal nem seria mau...
ResponderEliminarQuanto ao JT: também não sei porque deverias concordar. Discordar é preciso, concordar não é preciso. Nem é preciso estar à volta da mesa, eu já estou de acordo com o facto de não estares de acordo comigo. Quanto ao facto de ele "também despertar o melhor" tenho sérias dúvidas (mesmo muito sérias... aceito que o empirismo nem sempre seja muito clarividente e esclarecido, mas... esta não a compro ao desbarato), pois nestas dezenas que levo nunca observei tal (mas não sou dogmático, que não aceite alguma que outra excepção). Crê, JT, que não foram os tempos de crise que me inspiraram estas ideias... Aliás, esta crise ainda é um mistério para mim!
Acho bem que sujemos as mãos e até o resto "para evitar os salvadores da pátria", porém sem nos tornarmos nós em salvadores do que quer que seja... pois também corremos esse risco (de nos tornarmos salvadores), se não fizermos um grande esforço por traduzirmos na vida (coerência) o que ela nos vai propondo e pedindo. Dois abç's do Jj-a.
Jj-a: Já que não temos uma mesa de pinho para nos sentarmos, a da internet tem de desenrascar.
ResponderEliminarA questão do poder é de fato muito complexa e é-o ainda mais o "poder bom", aquele que resulta do que de melhor há em nós.
É caricato que seja eu, que tão mal me dou com (todos) os poderes, a advogar aqui a sua causa. Mas vou tentar.
Talvez eu seja menos exigente do que tu em relação aos homens, mas penso que o poder se pode exercer de forma correta e que há muito gente a fazê-lo bem.
Tendo o poder uma tal vocação para despertar egoísmos e ambições, exercê-lo corretamente é, só por si, um aspeto muito positivo. E não é por omissão, mas sim porque, no seu exercício, se respeitaram os outros e se cultivaram valores humanos, por outras palavras, aquilo a que chamamos democracia, salpicada dos valores do cristianismo ou da cidadania, como cada um quiser.
E isto vale para qualquer instituição: família, empresa, Igreja, Estado...
Um pai e uma mãe que conseguem viver em harmonia, educar os filhos em mútuo respeito, ajuadando-os a crescer, não será um feito extraordinário? O berro e a ruptura são mais associados à autoridade, mas são a via mais fácil, a que resulta do pior que há em nós.
Um homem muito injuriado, que começa agora a ser reabilitado: António Guterres (não sou do PS). Independentemente das suas opções políticas, não é isso que aqui está em causa, não exerceu ele o poder de forma correta, mesmo considerando que, como todos, sentou a máquina partidária à mesa do orçamento?
Fernando Nobre, o extraordinário líder da AMI, exerceria mal o poder se fosse eleito Presidente (não vou votar nele)? Mas ele já tinha poder, um outro, e deu provas de o exerecer bem!
Espero ter conseguido explicar o que é o "poder bom".
Um abraço.
José Teodoro
Um abraço
Pois, José teodoro; afasto-me de ti, sobretudo, no português unificado pelos crioulos. Quanto ao resto, dificilmente me convenço que o poder seja um mal desnecessário - ainda que, na esteira da melhor tradição céptica (com "p", s.f.f.), admita que o poder conjugado com o sonho degenere rapidamente em tirania.
ResponderEliminarDois abraços.
Nicolau Marques
Com "T" maiúsculo, claro.
ResponderEliminarMil perdões. :)
N.M.
JT,
ResponderEliminarDefino o poder como uma "relação desequilibrada", entre duas pessoas ou entre várias. Daí que o seu exercício seja tão complexo e difícil porque o equilíbrio também o é, para além de estar carregado de um grande subjectivismo. Mas aceitemos que até pudesse existir um "poder bom", que promovesse o equilíbrio na relação entre as pessoas no dia-a-dia... Destes exemplos de pessoas que tb. me são simpáticas, mas o exercício do poder não as melhorou, seguramente, a não ser entre um grupo de seguidores/apaniguados. Concedo até que ele seja necessário e que alguém tem de o exercer... mas que ele melhore aquele que o exerce e cujo prato da balança tem maior peso, isso não! Quando termina o exercício (alguns nunca terminam só mudam de espaço e actividade) não está melhor aos olhos de ninguém, a não ser de um pequeno grupo (alguns) de oportunistas. E a prova está como saíram todos ou quase... em relação ao modo como entraram nesse universo. Prometeram fazer, sacrificar-se, ser justos, coerentes, independentes, trabalhadores etc... etc... terminaram oportunistas, autoritários, vesgos, nepotistas, fracos, medrosos, injustos... dos milhões que o exerceram quantos ficaram na história limpos e admirados? Um abç j-a
De facto, não carece de demonstração: o poder, sempre corrompe; quando absoluto, fá-lo absolutamente. Daí, a superior valia do modelo liberal ensaiado no espaço cultural britânico (e norte-americano): a democracia e o estado de direito são, mais que poder, limitações do mesmo.
ResponderEliminarMais dois do Nicolau.
Vai animada a dialética do "bom" e do "mau" poder! Certo é que o poder é uma das características da natureza (humana, animal, vegetal). Há sempre alguém que se sobrepõe ao outro, quer pelo exercício da força (qualquer que ela seja, nem sempre física...), quer pela organização social da "polis". O acesso ao poder de um só se concretiza pela omissão/permissão do outro.
ResponderEliminarSe é verdade que os ultimos tempos se têm caracterizado pelo exercício do "mau poder", é também verdade que esse poder emerge da sociedade que todos integramos. Logo, escolhemos mal, temos um modelo de desenvolvimento assente em valores que têm que ser repensados, temos que ser proactivos na disseminação de valores dos quais possa emergir melhor poder, temos que educar melhor os nossos filhos...
Não simpatizando com a monarquia mas parece bem verdade que "fraco rei faz fraca a forte gente".
Há que mudar de "rei"...
Permito-me usar alguma malícia, para descontrair:
Todos nós sabemos que são precisas pessoas justas a governar o país. Justos. Por isso proponho que o próximo Primeiro-Ministro sej...a um soutien. Quem melhor? Oprime os grandes, levanta os caídos, protege e disfarça os pequenos.
Abraço,
Só uma boa lareira, com um fogo vivo e alegre, e uma boa pinga podia inspirar o f carvalho. A proposta do último parágrafo é deveras interessante sob o ponto de vista filosófico, pois levanta questões muito interessantes à minha tese de que o poder é mau e apoia, claramente, a do JT de que há um "poder bom". E também do ponto de vista social é relevante, pois encarna de alguma forma um conjunto de valores: justiça. compaixão, solidariedade... que muitos de nós prezam e cultivam. Oprimir os grandes, levantar os caídos e proteger/disfarçar os pequenos é sem dúvida um belo exemplo do "poder bom". Pensei num hino... desculpem a irreverência (derruba os poderosos de seus tronos e exalta os humildes). Sobre o rei, tenho dúvidas se é um forte rei que faz forte a fraca gente... a forte gente é que deve fazer forte um fraco rei (temo-nos demitido disso, creio). Jj-a
ResponderEliminarDo poder tenho uma visão puramente utilitarista. Uma espécie de mal dos fracos, útil para lidar com a comodidade humana que se alheia das suas responsabilidade. Vejo no exercício do poder um aproveitamento da demissão colectiva e do egoísmo individual que gera desequilíbrios, aproveitados por tentativas, mais ou memos conseguidas de recuperar o estado natural, onde o poder ou o seu exercício procuram de novo o equilíbrio.
ResponderEliminarNão sei o que se entende por “poder bom” ou por “poder mau”, o poder, como o entendo, é exercido a partir de consensos de que uns são beneficiários e outros puras vítimas, sempre na perspectiva utilitarista de quem o exerce, quer por colégio, quer individualmente. Gera sentimentos de justiça ou de injustiça, uma espécie de polícia do poder, que dá a quem o exerce, o mais das vezes, a sensação de equidade e àqueles que a ele se submetem um reduto de protecção.
O poder, como algo não natural, gera em si condicionalismos, a que se chamam regras. A regras, por si só, são actos previstos, forçados e fundamentais para o funcionamento e previsibilidade do poder. A nossa posição face ao poder é de submissão, porque no “jogo” do poder existe sempre o receio de outro poder, tornando-o ridículo mas real. Real, porque desejo o poder!
Defina-se "poder legítimo" como a possibilidade de, de algum modo, determinar outrém a partir de um reconhecimento de autoridade feito pelo próprio determinado. Neste sentido, o poder não é bom nem é mau.
ResponderEliminarClaro que, por aqui, trilhamos a via contratualista (nunca plenamente justificada como nunca absolutamente derrotada)e convocamos o "consentimento" como categoria decisiva para perceber a natureza da "respublica" enquanto quadro de referências que balizam a actuação e opções singulares de cada "cives"(propriamente condições adverbiais e não substantivas, i. é., concretas, definidas, universalmente imperativas - vá lá, j-a, não comeces a rir baixinho!...) e garantidas por alguém (por sistema hereditário ou não - a zaragata entre republicanos e monárquicos, de que se "celebra" com bacoco estardalhaço o centésimo aniversário, é absolutamente secundária)tido como guardião de uma comum representação.
Abraço.
Nicolau M.
XB,
ResponderEliminarSó três pontitos: 1) Eu chamei-lhe um textículo (lançamento) e jamais teria coragem de lhe chamar o que não é, um artigo; 2) Espanta-me que comeces por afirmar que o poder existe e "é imanente ao universo" e depois critiques o facto de eu fazer uma abordagem "demasiado imanente" só, como tu dizes, porque sou um "homem da igreja", que não sou. Eu sou igreja e igreja como tu és e qualquer cristão é (= povo de Deus). Essa é, muitas vezes, uma tentação subtil do poder: dizer a quem o não tem qual é/deve ser o enfoque com que deve abordar determinado assunto (traduzindo em linguagem de café e exagerando: "igreja para os padres, política para os leigos"). 3) Quanto a uma possível abordagem teológica do poder (Deus todo-poderoso, omnipotente, pantocrator...), não me diz nada porque o meu Deus é o da cruz, que é a antítese do poder, ou como gosto de chamar-lhe o "homem dos braços abertos", independentemente de alguns o acharem pouco transcendente . E isto porque o poder divino, ou de origem divina, foi vezes sem conta uma longa e trágica sucessão de tragédias ao longo dos tempos.Basta "ver" a história universal. Em nome de Deus fizeram-se mil coisas tão pouco divinas!
Sobre o ele -poder- ser uma coisa "maravilhosa" respeito as opiniões. Embora eu não pense assim, como fica claro no que escrevi. Sobre o imanente e o transcendente também muitas coisas se poderiam dizer. A fechar, quando escrevo só me interessa uma coisa: que alguém me leia. O que vem a seguir é simplesmente incontrolável (acordo /desacordo/ indiferença..., e isto porque a mente do outro ainda é território exclusivo dele, pelo menos por enquanto. Acho!
Um abç do Jj-a.
Meus caros!
ResponderEliminarPela primeira vez (nunca desde a última que aqui estive)me atrevo a fazer um comentário...já que se trata do "poder" ou de o poder fazer. O PODER, na minha modesta e humilde opinião, não tem som, nem cheiro, nem cor. Os que o exercem é que normalmente fazem um ruído insurdecedor e deixam um rasto de pestilência que nem o génio de Suskind conseguiria descrever. Os que o exercem, no máximo ou no mínimo, atingem sempre um carregado tom pardacento!
Já agora não me vou esquecer de um abraço para o José Teodoro e para o Xico Barroso!
Manuel A. João