No dia 16 de Novembro de 1965, 40 bispos que participavam no Concílio Vaticano II reuniram-se nas catacumbas Domitila, em Roma. Inspirados pelo que estava acontecendo e que havia sido dito durante o Concílio, assinaram o que hoje é conhecido como o Pacto das Catacumbas. Com este pacto, os bispos comprometeram-se a caminhar com os pobres e a ser uma Igreja pobre ao serviço dos pobres da Igreja. Para conseguir isso, eles comprometeram-se a levar uma vida simples e renunciar a todos os símbolos do poder. Ontem, iniciaram-se as comemorações desse acontecimento com uma Celebração da Palavra nas mesmas catacumbas. O texto continua actual e muitas das propostas que o papa Francisco tem feito à Igreja já ali se encontram. Em anexo segue o texto. Vale a pena ler, meditar e divulgar.
P. José Antunes, svd
“PACTO DAS
CATACUMBAS DA IGREJA SERVA E POBRE [1]
Nós, Bispos, reunidos no
Concílio Vaticano II, esclarecidos sobre as deficiências de nossa vida de
pobreza segundo o Evangelho; incentivados uns pelos outros, numa iniciativa em
que cada um de nós quereria evitar a singularidade e a presunção; unidos a
todos os nossos Irmãos no Episcopado; contando sobretudo com a graça e a força
de Nosso Senhor Jesus Cristo, com a oração dos fiéis e dos sacerdotes de nossas
respectivas dioceses; colocando-nos, pelo pensamento e pela oração, diante da
Trindade, diante da Igreja de Cristo e diante dos sacerdotes e dos fiéis de
nossas dioceses, na humildade e na consciência de nossa fraqueza, mas também
com toda a determinação e toda a força de que Deus nos quer dar a graça, comprometemo-nos
ao que se segue:
1) Procuraremos viver segundo o modo ordinário
da nossa população, no que concerne à habitação, à alimentação, aos meios de
locomoção e a tudo que daí se segue. Cf. Mt 5,3; 6,33s; 8,20.
2) Para sempre renunciamos à aparência e à
realidade da riqueza, especialmente no traje (fazendas ricas, cores berrantes),
nas insígnias de matéria preciosa (devem esses signos ser, com efeito,
evangélicos). Cf. Mc 6,9; Mt 10,9s; At 3,6. Nem ouro nem prata.
3) Não possuiremos nem imóveis, nem móveis, nem
conta em banco, etc., em nosso próprio nome; e, se for preciso possuir, poremos
tudo no nome da diocese, ou das obras sociais ou caritativas. Cf. Mt 6,19-21;
Lc 12,33s.
4) Cada vez que for possível, confiaremos a
gestão financeira e material em nossa diocese a uma comissão de leigos
competentes e cônscios do seu papel apostólico, em mira a sermos menos
administradores do que pastores e apóstolos. Cf. Mt 10,8; At. 6,1-7.
5) Recusamos ser chamados, oralmente ou por
escrito, com nomes e títulos que signifiquem a grandeza e o poder (Eminência,
Excelência, Monsenhor...). Preferimos ser chamados com o nome evangélico de
Padre. Cf. Mt 20,25-28; 23,6-11; Jo 13,12-15.
6) No nosso comportamento, nas nossas relações
sociais, evitaremos aquilo que pode parecer conferir privilégios, prioridades
ou mesmo uma preferência qualquer aos ricos e aos poderosos (ex.: banquetes
oferecidos ou aceitos, classes nos serviços religiosos). Cf. Lc 13,12-14; 1Cor
9,14-19.
7) Do mesmo modo, evitaremos incentivar ou
lisonjear a vaidade de quem quer que seja, com vistas a recompensar ou a
solicitar dádivas, ou por qualquer outra razão. Convidaremos nossos fiéis a
considerarem as suas dádivas como uma participação normal no culto, no
apostolado e na ação social. Cf. Mt 6,2-4; Lc 15,9-13; 2Cor 12,4.
8) Daremos tudo o que for necessário de nosso
tempo, reflexão, coração, meios, etc., ao serviço apostólico e pastoral das
pessoas e dos grupos laboriosos e economicamente fracos e subdesenvolvidos, sem
que isso prejudique as outras pessoas e grupos da diocese. Ampararemos os
leigos, religiosos, diáconos ou sacerdotes que o Senhor chama a evangelizarem
os pobres e os operários compartilhando a vida operária e o trabalho. Cf. Lc
4,18s; Mc 6,4; Mt 11,4s; At 18,3s; 20,33-35; 1Cor 4,12 e 9,1-27.
9) Cônscios das exigências da justiça e da
caridade, e das suas relações mútuas, procuraremos transformar as obras de
"beneficência" em obras sociais baseadas na caridade e na justiça,
que levam em conta todos e todas as exigências, como um humilde serviço dos
organismos públicos competentes. Cf. Mt 25,31-46; Lc 13,12-14 e 33s.
10) Poremos tudo em obra para que os
responsáveis pelo nosso governo e pelos nossos serviços públicos decidam e
ponham em prática as leis, as estruturas e as instituições sociais necessárias
à justiça, à igualdade e ao desenvolvimento harmônico e total do homem todo em
todos os homens, e, por aí, ao advento de uma outra ordem social, nova, digna
dos filhos do homem e dos filhos de Deus. Cf. At. 2,44s; 4,32-35; 5,4; 2Cor 8 e
9 inteiros; 1Tim 5, 16.
11) Achando a colegialidade dos bispos sua
realização a mais evangélica na assunção do encargo comum das massas humanas em
estado de miséria física, cultural e moral - dois terços da humanidade -
comprometemo-nos:
- a participarmos, conforme nossos meios, dos
investimentos urgentes dos episcopados das nações pobres;
- a requerermos juntos ao plano dos organismos
internacionais, mas testemunhando o Evangelho, como o fez o Papa Paulo VI na
ONU, a adoção de estruturas econômicas e culturais que não mais fabriquem
nações proletárias num mundo cada vez mais rico, mas sim permitam às massas
pobres saírem de sua miséria.
12) Comprometemo-nos a partilhar, na caridade
pastoral, nossa vida com nossos irmãos em Cristo, sacerdotes, religiosos e
leigos, para que nosso ministério constitua um verdadeiro serviço; assim:
- esforçar-nos-emos para "revisar nossa
vida" com eles;
- suscitaremos colaboradores para serem mais uns
animadores segundo o espírito, do que uns chefes segundo o mundo;
- procuraremos ser o mais humanamente presentes,
acolhedores...;
- mostrar-nos-emos abertos a todos, seja qual
for a sua religião. Cf. Mc 8,34s; At 6,1-7; 1Tim 3,8-10.
13) Tornados às nossas dioceses respectivas,
daremos a conhecer aos nossos diocesanos a nossa resolução, rogando-lhes
ajudar-nos por sua compreensão, seu concurso e suas preces.
AJUDE-NOS
DEUS A SERMOS FIÉIS".
[1] KLOPPENBURG, Boaventura
(org.). Concílio Vaticano II. Vol. V,
Quarta Sessão. Petrópolis: Vozes, 1966, 526-528. Assinado nas catacumbas de Domitila, Roma, no
dia 16 de novembro de 1965.
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